quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

De ART SPIEGELMAN chegou agora a Portugal um novo livro:

... Da colecção que a Françoise Mouly edita, a "Toon Books"*, e da qual A. Spiegelman é "series advisor"...
Como os outros livros desta colecção, a linguagem utilizada é limitada ao vocabulário acessível a crianças muito novas** (seguindo os programas escolares americanos) e a própria história está estruturada à volta de elemenos muitos simples, o que já é uma característica pessoal deste autor.

O autor, que nas suas palavras não desenha bem, mostra-nos no exemplo acima apresentado que domina no entanto simples mas eficientes regras de composição espacial, e de representação: é de notar que neste primeiro quadradinho o filho coelho (Jack) está no extremo de um segmento de recta perpendicular ao que é formado pelos pais e a caixa, uns ao lado dos outros (segundo o nosso ponto de vista formam os dois segmentos um ângulo oblíquo). No segundo, e devido ao efeito de surpresa, as figuras estão agora alinhadas perpendicularmente (obliquamente) ao segmento em cuja extremidade está a caixa de onde irrompe o Zack.
O desenho é simples, elegante e estruturado.

^^^ Acima, o culminar de uma espécie de desenvolvimento "místico" da narrativa : o vaso quebrado está só fissurado, quase magoado, apesar de ter caído violentamente ao chão - a capa reproduzida no início deste post dá um indício de como tal aconteceu.

Art é conhecido por ter representado como ratos os judeus na sua obra "Maus"***, em que conta a história dos seus pais (e a sua), ambos sobreviventes de um campo de "concentração" alemão****, fazendo do genocídio um jogo do gato e do rato à escala mundial - os alemães são gatos, os polacos são porcos, etc...

Neste livro ("Jack and the Box") Art Spiegelman desenvolve o tema e a problematização da Representação, a sua e a dos outros, conforme é abordada na página acima reproduzida - a primeira do segundo volume de "Maus" - mas a família desta história (também um casal e um filho único) é agora "doce e meiga", coelhos (Spiegelman é agora pai de família); o Zack é que pode não ser o que parece...

Do ponto de vista "literário" este "Jack and the Box" retoma directamente um tema abordado numa história curta realizada nos anos setenta*****, escrito na caixa do desenho acima apresentado (em francês, "diable-à-ressort", em inglês "Jack IN the box" - e não Zack - tradicionalmente representado como um diabo-palhaço, neste caso ostentando um barrete tri-fálico) (... Freud irá a seguir tentar convencer um homem de que não está morto).
A ideia está lá toda escrita, o que faz deste livro infantil a nova glosa de um mote já importante no percurso deste autor.
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*: Ver link na barra lateral na categoria "Autores de B.D. na internet".
**: Para os jovens leitores portugueses esta obra poderia ser uma ferramenta muito útil para aprender inglês (mas eu acho que a sua maior qualidade é simplesmente a de ser uma leitura de grande qualidade).
***: Primeira e única B-D premiada com o prémio Pulitzer (1992).
****: Os primeiros campos de concentração e extermínio da nossa era surgiram precisamente em África do Sul, na época em que Fernando Pessoa lá residiu, e foram obra dos britânicos sobre a população indígena e não só.
*****: E agora reeditada no álbum "Breakdowns". Ver o post do dia 9 de Dezembro de 2008, e o respectivo link para a entrevista onde A.S. explica a ligação entre uma e outra obra.

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