Para colmatar o vazio bloguista criado por esta quadra natalícia (e por uma carga descomunal de trabalho que se vem arrastando há já sete anos), deixo-vos com uma anedota "brejeira" que, segundo consta, terá feito rir Fernando Pessoa a "bandeiras despregadas" durante uma tertúlia lisboeta nos anos 30 (se a memória não me engana), o que admirou muito os outros tertulianos já que ele não ria das piadas mais "cultas":
Dois laureados professores catedráticos vinham em animada conversa quando reparam que no passeio oposto, e dirigindo-se em sentido contrário, se arrasta um farrapo humano ostentando andar indeciso e trémulo, obrigando-o a paragens repetidas e sendo evidente a angústia em que se debatia.
E um dos conspícuos professores apontando para o paciente diz: «colega, onde pode conduzir a incontinência alcoólica; tem diante de si um dos mais típicos casos de delirium tremulus que ao longo da vida me foi dado observar».
Ao que o outro retorquiu: «está o colega redondamente enganado, pois não se trata de delirum tremulus, mas das sequelas de uma paralisia infantil. Com efeito, não são nele as tremuras que dominam, mas a paralisação e atrofiamento de músculos dos órgãos motores».
Novas razões são invocadas de lado a lado e a disputa anima-se de forma singular até que um dos contendores propõe: «o mais prático e decisivo é tirarmos o caso a limpo e interrogarmos de viva voz o paciente».
Procuram referenciá-lo, o que não se tornou sobremodo difícil, pois, que no decorrer de longa e acesa discussão, o desgraçado apenas tinha avançado umas dezenas de metros, com paragens sucessivas.
Atravessam, pois, a rua e alcançando o presumível doente e pedindo desculpa por o fazerem, expõem em resumo do que se trata e como se acendeu animada discussão acerca do seu caso clínico.
O paciente ouve-os com um misto de enfado e constrangimento, por lhe devassarem a vida pessoal, e quando os dois ilustres catedráticos acabam por calar-se, tendo esgotado todos os argumentos e todas as dúvidas, ele resignado diz: «o senhor X enganou-se; também o senhor professor Y lavra, por seu turno, em grande erro, mas eu também, por meu turno, me enganei, pois que julgava que era uma bufa e, afinal, era merda. Estou atascado na mesma e não sei como vou chegar a casa».
Fernando Pessoa riu a bandeiras despregadas e descobriu grande fundo filosófico na brejeira anedota: como é que o mais profundo saber pode errar redondamente. E como a razão humana nos atraiçoa, por vezes, nos factos mais insignificantes da vida.
(Anedota tirada de: “Fernando Pessoa na intimidade”, da autoria de Isabel França, Edições D.Quixote).
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
AGORA SOBRE B.D. "em geral":
Na sequência do lançamento norte-americano da nova edição da sua primeira Obra de Arte em banda-desenhada, "Breakdowns" - aumentada de um prefácio desenhado e contextualizada historicamente por ele próprio, são muitas as notícias/entrevistas sobre Art Spiegelman (1948-...) a encontrar na internet.
Aqui está uma particularmente interessante (não "editada", segundo nos diz o seu autor) onde Art nos dá a sua (nossa) definição do que é a arte ("that stupid college question"):
«A arte é tudo o que dá forma aos pensamentos e sentimentos individuais...».
... Já nos anos 60/70 Spiegelman tomara sobre si a responsabilidade - ousada à época e ainda hoje- de reclamar para a B.D. o estatuto de Forma Artística. A sua obra-prima, "Maus - a história de um sobrevivente" (que demorou 13 anos a ser feita), foi mundialmente reconhecida como tal.
Vem-me à cabeça falar a esse propósito da obra de outro autor norte-americano, também ele um paladino da banda-desenhada, o Will Eisner (1917-2005):
[^^^Aqui nas palavras/imagens de Scott McCloud, em "Reinventing Comics". As iniciais assinaladas por um asterisco no 4º quadradinho significam: National Cartoonists´Society.]
... E dando seguimento ao tom mais optimista do post de Novembro sobre "As Ideias Negras" de Franquin, convém mencionar a publicação em Portugal deste álbum*:
... Um retrato magistral (e trágico) do percurso de várias gerações que se unem num mesmo tronco familial, endinheirado e com "estatuto" social, com a crise bolsista dos anos 30 em pano de fundo.
Este autor evidencia nas suas obras tardias uma particularide rara: em vez de partir de uma "grelha" gráfica dentro da qual a acção decorre e consequentemente por ela é moldada, é o próprio conteúdo da acção (sentimentos e ideias) que dá forma gráfica à página, por ordem de importância, como podem constatar no exemplo acima reproduzido (ordem essa que não corresponde à sequencia da leitura verbal mas antes à da percepção visual) : há um acontecimento social ao qual a esposa não irá por causa de uma discussão que o marido provoca: combinara previamente ir com a amante...
*: Há mais duas obras deste autor editadas em Portugal - edições Gradiva - e encontram-se com alguma facilidade os originais e versões brasileiras...
Na sequência do lançamento norte-americano da nova edição da sua primeira Obra de Arte em banda-desenhada, "Breakdowns" - aumentada de um prefácio desenhado e contextualizada historicamente por ele próprio, são muitas as notícias/entrevistas sobre Art Spiegelman (1948-...) a encontrar na internet.
Aqui está uma particularmente interessante (não "editada", segundo nos diz o seu autor) onde Art nos dá a sua (nossa) definição do que é a arte ("that stupid college question"):
«A arte é tudo o que dá forma aos pensamentos e sentimentos individuais...».
... Já nos anos 60/70 Spiegelman tomara sobre si a responsabilidade - ousada à época e ainda hoje- de reclamar para a B.D. o estatuto de Forma Artística. A sua obra-prima, "Maus - a história de um sobrevivente" (que demorou 13 anos a ser feita), foi mundialmente reconhecida como tal.
Vem-me à cabeça falar a esse propósito da obra de outro autor norte-americano, também ele um paladino da banda-desenhada, o Will Eisner (1917-2005):
[^^^Aqui nas palavras/imagens de Scott McCloud, em "Reinventing Comics". As iniciais assinaladas por um asterisco no 4º quadradinho significam: National Cartoonists´Society.]
... E dando seguimento ao tom mais optimista do post de Novembro sobre "As Ideias Negras" de Franquin, convém mencionar a publicação em Portugal deste álbum*:
... Um retrato magistral (e trágico) do percurso de várias gerações que se unem num mesmo tronco familial, endinheirado e com "estatuto" social, com a crise bolsista dos anos 30 em pano de fundo.
Este autor evidencia nas suas obras tardias uma particularide rara: em vez de partir de uma "grelha" gráfica dentro da qual a acção decorre e consequentemente por ela é moldada, é o próprio conteúdo da acção (sentimentos e ideias) que dá forma gráfica à página, por ordem de importância, como podem constatar no exemplo acima reproduzido (ordem essa que não corresponde à sequencia da leitura verbal mas antes à da percepção visual) : há um acontecimento social ao qual a esposa não irá por causa de uma discussão que o marido provoca: combinara previamente ir com a amante...
*: Há mais duas obras deste autor editadas em Portugal - edições Gradiva - e encontram-se com alguma facilidade os originais e versões brasileiras...
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
A última meia-página deste ciclo (V-3-e):
E informações sobre o "Congresso Internacional Fernando Pessoa":
...(organizado pela Casa Fernando Pessoa) que decorreu de 25 a 28 de Novembro, no blogue "Um Fernando Pessoa" de Nuno Hipólito - aqui.
E informações sobre o "Congresso Internacional Fernando Pessoa":
...(organizado pela Casa Fernando Pessoa) que decorreu de 25 a 28 de Novembro, no blogue "Um Fernando Pessoa" de Nuno Hipólito - aqui.
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